Os protestos contra o aumento da tarifa de ônibus em São Paulo completam dez anos neste mês -- uma revolta que fica marcada por desdobramentos na história recente da política brasileira: após ganhar força nas redes sociais, a demanda pelo acesso ao transporte público foi pulverizada em críticas aos gastos com a Copa de 2014, às denúncias de corrupção e à insatisfação generalizada contra o governo de Dilma Rousseff (PT).
Do terremoto social que emergiu das manifestações, foram lançados diferentes movimentos e novos atores no cenário político.
Protestos de junho de 2013 — Foto: g1
Para entender seu impacto no Brasil de 2023, Natuza Nery conversa com Roberto Andrés, professor da escola de arquitetura da UFMG e autor do livro “A razão dos centavos: crise urbana, vida democrática e as revoltas de 2013".
Ele lembra que o pós-junho de 2013 foi marcado pela profusão de movimentos populares pelo país e que o acirramento da polarização política começa a aparecer no contexto das eleições presidenciais de 2014 e coincide com a ascensão da extrema direita mundial.
“Os autoritários de extrema-direita surgem na segunda metade da década com falsas soluções para os mesmos problemas”, afirma Roberto.
No Brasil, um dos efeitos diretos foi o centrão conseguir se "metamorfosear" para sobreviver, interferindo no Executivo.
O autor ainda ressalta que as revoltas contra aumentos tarifários remontam desde o século 19, um sinal de que “a questão da mobilidade urbana nunca foi bem endereçada”, avalia.
Roberto também diz que a crise do transporte público está entre as demandas que não foram absorvidas pelo campo da esquerda.
"Acho que a gente continua talvez repetindo alguns modelos, como por exemplo o incentivo ao automóvel particular, que gerou uma grande crise do transporte público naquele momento."