Crianças Yanomami resgatadas neste domingo, 22 de janeiro de 2023 — Foto: Weibe Tapeba/Sesai/Divulgação
"É uma operação de guerra". É assim que o secretário de Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde, Weibe Tapeba, classifica o atendimento que tem sido feito a indígenas doentes que precisam de socorro urgente dentro da Terra Yanomami.
Tapeba está na região de Surucucu e, nesse domingo (22), acompanhou de perto o resgate de 16 Yanomami com quadro grave de desnutrição em uma comunidade dominada pelo garimpo - a atividade ilegal é a principal causa da crise sanitária no território.
Ao se deparar com o cenário de dezenas de indígenas debilitados, ele afirmou, em rápida entrevista ao g1 nesta segunda-feira (23), que tem a impressão que os indígenas foram abandonados: "A sensação é que o estado Brasileiro virou as costas para o território".
"Fizemos o resgate de pelo menos 16 pacientes Yanomami com quadro de desnutrição muito avançada. É uma operação de guerra, o território está totalmente ocupado, uma grande área do território está ocupada por garimpeiros. São mais de 20 mil garimpeiros, e são 30 mil Yanomami. A sensação que eu tenho é que o Estado brasileiro estava de costa para esse território, para o povo Yanomami", disse.
O resgate dos 16 Yanomami, maioria crianças extremamente desnutridas, ocorreu com apoio da Força Aérea Brasileira e do Exército. Eles foram levados para o polo base de Surucucu - unidade considerada de referência na região, mas que se resume a um barracão de madeira de chão batido e com estrutura precária.
Diante do que viu, Tabepa vai propor ao Ministério da Saúde que seja implantado dentro da reserva um hospital de campanha, que inclua estrutura de alojamento e cozinha comunitária. A ideia é montar a unidade em Surucucu, região considerada o centro da Terra Indígena.
Além da medida emergencial da instalação do hospital de Campanha, a Sesai deve montar um plano de ação que inclua a melhoria de infraestrutura dos polos de saúde, além da logística, insumos, medicamentos, equipamentos, águia potável energia e internet.
Crianças Yanomami são resgatadas em operação do Ministério da Saúde com apoio do Exército — Foto: Urihi/Divulgação
Tapeba chegou a Roraima no sábado (21). Ele estava na comitiva de Lula (PT), que viajou ao estado para ver de perto a desassistência aos Yanomami. O presidente se surpreendeu com o que encontrou:
"Se alguém me contasse que em Roraima tinham pessoas sendo tratadas dessa forma desumana, como vi o povo Yanomami aqui, eu não acreditaria. O que vi me abalou. Vim aqui para dizer que vamos tratar nossos indígenas como seres humanos."
"É um cenário de muita guerra. O que a gente viu ontem é de partir o coração", reforçou Tabepa sobre a grave crise sanitária enfrentada pelo povo Yanomami.
Maior reserva indígena do Brasil, a Terra Yanomami registra nos últimos anos agravamento na saúde dos indígenas, com casos graves de crianças e adultos com desnutrição severa, verminose e malária, em meio ao avanço do garimpo ilegal.
Só em 2022, segundo o governo federal, 99 crianças Yanomami morreram, na maioria, por desnutrição, pneumonia e diarreia, que doenças evitáveis. A estimativa é que, ao todo no território, 570, crianças morreram nos últimos quatro anos, na gestão de Jair Bolsonaro.
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Com a visita de Lula a Roraima para tratar sobre a crise sanitária, a dramática situação do povo Yanomami se tornou um dos assuntos mais comentados no país Twitter. Muitas pessoas, ao verem as imagens das vítimas, chamaram de "barbárie" e "descaso".
Em 2021, o g1 e o Fantástico já tinham registrado cenas inéditas e exclusivas - semelhantes às divulgadas recentemente, de crianças extremamente magras, com quadros aparentes de desnutrição e de verminose, além de dezenas de indígenas doentes com sintomas de malária em comunidades Yanomami.
Para buscar solução à crise sanitária Yanomami, o Ministério da Saúde declarou emergência de saúde pública. Lula também criou o Comitê de Coordenação Nacional para discutir e adotar medidas em articulação entre os poderes para prestar atendimento a essa população. O plano de ação deve ser apresentado no prazo de 45 dias, e o comitê trabalhará por 90 dias, prazo que pode ser prorrogado.
Foto de outubro de 2021 mostra polo de Surucucu. Espaço com paredes de madeira e chão de terra no polo de Surucucu que funciona como enfermaria onde os Yanomami são internados em redes — Foto: Valéria Oliveira/g1/Arquivo