Durante mais de dois meses, extremistas inconformados com o resultado da eleição se instalaram em frente ao quartel-general do Exército na capital federal. Apoiado em discursos golpistas e incitação à violência, o acampamento tinha superestrutura, se radicalizou e foi base dos ataques terroristas de 8 de janeiro ao Congresso Nacional, ao Palácio Planalto e ao Supremo Tribunal Federal (STF).
A exemplo do ocorrido em diversos quartéis pelo país, os bolsonaristas antidemocráticos em Brasília pediam intervenção militar e propagavam teorias conspiratórias e fake news. Enquanto isso, do lado de fora, Lula foi diplomado, tomou posse e é o novo presidente do Brasil. E mais de 1,4 mil pessoas foram presas por envolvimento na barbárie.
Entre a meia-noite de 30 de outubro, o dia do segundo turno, quando radicais começaram a falar que era preciso esperar 72 horas para que algo mudasse, e as 9h da manhã de 9 de janeiro, quando o acampamento de Brasília começou a ser desmontado, passaram-se 1.689 horas. Veja, no comparativo abaixo, discursos e atos criminosos propagados e cometidos pelos extremistas ao longo desse tempo e sucessão de decisões e fatos no mundo fora do universo golpista e inconstitucional.
Veja depois, ao final desta página especial, um vídeo que reconta essa história.
Falsa "tese" das 72 horas é renovada sempre que o prazo expira (e nada acontece).
?? Após a derrota de Bolsonaro para Lula no 2º turno das eleições em 30 de outubro, apoiadores radicais do ex-presidente reúnem-se em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília, onde montam um acampamento golpista.
? A exemplo de diversos atos antidemocráticos espalhados pelo país, inclusive em rodovias, extremistas clamam por intervenção militar, fazem ameaças violentas e pedem aos frequentadores que continuem mobilizados por “72 horas”.
? Segundo essa “tese”, que se converteria num lema sempre renovável, Bolsonaro deve guardar silêncio por três dias, até que possa adotar alguma medida capaz de reverter o resultado das urnas.
? Mas Bolsonaro não espera 72 horas, não. Em 1º de novembro, ele faz o 1º pronunciamento após fracassar na tentativa de se reeleger.
? Ele lê um discurso curto, de 2 minutos, diz que continuará cumprindo a Constituição e defende “manifestações pacíficas”, às quais classifica como “fruto de indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral”.
? Logo após a breve fala de Bolsonaro, o ministro Ciro Nogueira (Casa Civil) assume o microfone no púlpito e fala que dará início à transição de governo, tema que não tinha sido abordado pelo presidente.
Golpistas disseminam falsa prisão do ministro do STF e presidente do TSE.
? Depois das eleições, em vários momentos golpistas propagam mentira sobre a suposta prisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF. Presidente do TSE, ele é um dos alvos preferenciais de bolsonaristas radicais desde a abertura do inquérito das fake news, em 2019.
??? Extremistas passam a espalhar essa mentira e a pedir a prisão de Moraes (a quem chamam de Xandão), como neste registro de 29 de dezembro no acampamento golpista em Brasília.
??? Em 1º de novembro, a maioria dos ministros do STF vota por manter uma decisão tomada na véspera por Moraes, que na época determinou que polícias desbloqueassem rodovias interditadas por bolsonaristas.
? Dois dias mais tarde, Moraes afirma que o resultado das urnas é incontestável e que os criminosos que atacam o sistema eleitoral serão responsabilizados: “O 2º turno democraticamente acabou no último domingo. O TSE proclamou o vencedor”.
? A partir dali, Moraes toma outras ações: em 17 de novembro, manda bloquear contas de pessoas e empresas supostamente ligadas a atos antidemocráticos; em 23 de novembro, multa o PL em R$ 23 milhões após o partido pedir anulação de votos na eleição sem indicar prova de fraude.
Extremistas tentam invadir PF no dia da cerimônia.
? Em 12 de dezembro, ocorre a diplomação de Lula (na prática, a cerimônia confirma o processo eleitoral e autoriza a chapa vencedora a tomar posse). No discurso, o presidente eleito chora ao se lembrar de críticas por não ter diploma universitário.
?? Em seu discurso, Alexandre de Moraes afirma que a diplomação atesta a “vitória plena” da democracia e do Estado de Direito. Também critica a disseminação de "fake news".
? No mesmo 12 de dezembro, extremistas espalham (e comemoram) uma mentira: a diplomação (que um deles chamou de “diplomacia”) de Lula vai ser cassada (não foi), e a suspensão vai sair no “Diário Oficial da União” (não saiu).
?? Também no dia 12 e depois da diplomação do adversário, Bolsonaro recebe apoiadores diante do Palácio da Alvorada. Lá, ouve uma oração acompanhado de um religioso e de crianças, mas não discursa.
? Naquela noite, bolsonaristas radicais promovem diversos atos de vandalismo em Brasília. Eles tentam invadir a sede da PF e atacam uma delegacia. Carros e ônibus e são danificados e incendiados. Ninguém é preso.
? A depredação começa em frente à PF, após o cumprimento de um mandado de prisão temporária contra o indígena José Acácio Tserere Xavante, apoiador de Bolsonaro.
? 12 dias depois, na véspera de natal, um explosivo é encontrado perto do Aeroporto de Brasília.
?? Segundo autoridades, o acampamento de extremistas em frente ao Exército tem relação tanto com esse episódio quanto com a noite de barbárie de 12 de dezembro.
? Preso como autor do atentado de 24 de dezembro, George Washington de Oliveira Sousa, de 54 anos, declara ter participado de atos antidemocráticos e que sua intenção era iniciar o "caos" e que pretendia alcançar a decretação de estado de sítio no país.
? Em 28 de dezembro, Alexandre de Moraes suspende temporariamente porte de armas de fogo no DF, atendendo a um pedido da equipe de Lula às vésperas da posse. A suspensão ocorre quatro dias após o bolsonarista George Washington ser autuado em flagrante por terrorismo.
Golpistas falam em não desistir após live final Bolsonaro mas se frustram após fala de Mourão.
? Em 30 de dezembro, depois da última live de Bolsonaro como presidente, radicais no acampamento dizem que não irão retroceder e insistem: “Não desanimem. O presidente não pediu pra gente sair, [...] estava só se despedindo”.
?? Depois de semanas de reclusão e longe das transmissões, Bolsonaro fica com voz embargada algumas vezes durante a live e faz longas pausas. Na tarde do próprio dia 30 de dezembro, embarca no avião presidencial rumo aos EUA.
? Na ausência do titular, cabe ao vice Hamilton Mourão fazer um pronunciamento de fim de ano. No discurso de 31 de dezembro, ele critica “lideranças” que, “com silêncio”, deixaram para as Forças Armadas a conta por “inação” ou por um “pretenso golpe”.
?? Sem falar diretamente dos acampamentos golpistas, Mourão declarou: "Tranquilizemo-nos! Retornemos à normalidade da vida, aos nossos afazeres e ao concerto de nossos lares".
? Após as falas de Bolsonaro e Mourão, o número de golpistas no acampamento em Brasília cai bastante. Se antes dos pronunciamentos parte deles ainda tinha expectativa de algum anúncio que mudaria tudo, agora os extremistas declaram decepção com o ex-vice-presidente e o chamam de traidor.
Golpistas acreditam que presidente eleito não subirá a rampa do Planalto.
?? Com a proximidade da cerimônia que vai oficializar Lula no poder, extremistas resolvem convocar Bolsonaro para tomar “posse” em frente ao acampamento golpista em Brasília no dia 1º de janeiro.
? No acampamento, extremistas alegam várias vezes que Lula não assumirá a Presidência porque viajou para a Venezuela, tendo deixado um sósia no Brasil.
? Quando chega, enfim, o 1º de janeiro, bolsonaristas radicais propagam a mentira de que Lula não tomará posse, não. Em vídeos registrados nas redes sociais, muitos choram de emoção e pedem intervenção militar.
??? Na tarde de 1º de janeiro de 2023, em sessão solene no Congresso Nacional, Luiz Inácio Lula da Silva toma posse como o 39º presidente do Brasil, dando início a seu terceiro mandato. No discurso, fala em "democracia para sempre".
? A cerimônia leva centenas de milhares de apoiadores do petista à Esplanada dos Ministérios. Em momento marcante, Lula recebe a faixa presidencial de pessoas comuns, representantes do povo brasileiro.
? Nas redes sociais golpistas, circulam mensagens afirmando que a faixa usada por Lula solenidade foi fraudada, pois é diferente da que Jair Bolsonaro usou ao assumir o governo em 2018.
? É #FAKE esse papo da “faixa falsa”. O adereço que Lula recebeu é realmente diferente do utilizado por Bolsonaro quatro anos antes, mas ambos são autênticos.
?? Ao longo dos mais de dois meses de movimento golpista, bolsonaristas clamam em diversos momentos pela ajuda do general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional do governo Bolsonaro. Em 2 de janeiro, radicais espalham a mentira de que Heleno assumiu o comando do país.
?? Em 1º de janeiro de 2023, o “Diário Oficial da União” publica a exoneração de 19 ministros de Bolsonaro. Augusto Heleno está entre eles.
?? Em 2 de janeiro, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, reúne-se com 15 chefes de Estado que, na véspera, participaram da cerimônia de posse.
Extremistas partem do acampamento golpista antes da depredação dos Três Poderes.
? No início de janeiro, ocorre uma debandada no acampamento golpista, que neste momento fica com não mais que 200 pessoas. Mas, a partir do dia 7, ocorre invasão em massa a Brasília, que vê chegarem mais de cem ônibus, com cerca de 4 mil pessoas.
? É do acampamento que sai boa parte do grupo de terroristas que depredam o Congresso, o Planalto e o STF. Na caminhada de 8 Km até a Praça dos Três Poderes, a horda de vândalos é escoltada pela polícia.
?? Terroristas quebram vidraças e móveis, vandalizam obras de arte e objetos históricos, invadem gabinetes de autoridades, rasgam documentos e roubam armas. Muitos deles transmitem a selvageria ao vivo, nas redes sociais.
? Depois da barbárie, parte dos extremistas retorna ao acampamento golpista em frente ao quartel-general do Exército. Alguns dizem querer "botar fogo no STF".
? Embora as ações antidemocráticas dos golpistas estejam sendo combinadas há dias pelas redes sociais, autoridades DF não adotam medidas preventivas para proteger os prédios.
? PM do DF é criticada por se omitir. Vídeos mostram policiais conversando com bolsonaristas e filmando a invasão do Congresso.
? À tarde, o governador do DF, Ibaneis Rocha, anuncia exoneração do Secretário de Segurança Pública do DF, o bolsonarista Anderson Torres, que está de férias nos Estados Unidos e tinha sido ministro da Justiça do governo anterior.
? O presidente Lula, que estava no interior de SP no momento dos ataques, volta a Brasília na noite de 8 de janeiro e decreta intervenção federal para assumir a segurança pública do DF. Alexandre de Moraes afasta Ibaneis do cargo por 90 dias.
? Na noite do dia 8, centenas de golpistas são presos em flagrante. Fotos e vídeos permitem a identificação de vários terroristas.
? Na manhã de 9 de janeiro, a PM do DF e o Exército realizam uma operação para desmontar o acampamento golpista, após decisão de Alexandre de Moraes.
? Os criminosos são retirados do local em cerca de 50 ônibus e levados ao ginásio da Academia Nacional da PF para passar por triagem. Depois, eles são encaminhados ao Complexo da Papuda ou à Penitenciária Feminina do DF.
? Mais de 1,4 mil bolsonaristas golpistas são presos.
? Em 9 de janeiro, Lula se reúne com governadores de 23 estados e representantes de outros quatro. “Não vamos permitir que a democracia escape das nossas mãos”, afirmou. Depois, ele saiu em caminhada simbólica com ministros até o STF.
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