Garimpeiros ilegais que atuam na Terra Indígena Yanomami começaram a fugir do território após o início de ações de repressão à atividade clandestina. Na última quarta-feira (1º), a Força Aérea Brasileira iniciou controle do espaço aéreo e usa aeronaves com radares superpotentes.
Vídeos que circulam nas redes sociais desde a última quinta-feira (31) mostram homens e mulheres em grupos deixando a região caminhando pela floresta e pelos rios, em barcos lotados (veja vídeo acima).
Segundo a polícia, o motivo da fuga é por conta de uma grande operação que vai acontecer nos próximos dias para expulsar, de vez, os garimpeiros do território. A reserva indígena será ocupada pelas Forças Armadas Nacional e pela Polícia Federal.
A estimativa é que ao menos 20 mil garimpeiros estejam na Terra Indígena Yanomami. A ação ilegal deles causou uma crise humanitária sem precedentes no território. São pouco mais de 30 mil Yanomami na área que deveria, por lei, ser preservada. No entanto, tem sofrido com o avanço do garimpo ilegal, que só em 2022 cresceu 54%.
Para se ter uma ideia, de Surucucu, região de referência no território, até Boa Vista são ao menos 280 km — o que dá cerca de 1h30 de voo. A região é de mata fechada e montanhosa, o que pode agravar o trajeto de fuga dos garimpeiros. Já de barco, eles devem enfrentar um percurso de, pelo menos, sete dias pelo rio Urariocera.
Em outro vídeo, garimpeiros afirmam estar sem comida e pedem ao Exército e à polícia para serem resgatados da Terra Yanomami. O local é abastecido por aeronaves, mas com o bloqueio aéreo, o "rancho" -- como chamam a alimentação -- não chega até as áreas de garimpo onde os criminosos estão instalados.
Nas imagens, um garimpeiro diz que há ao menos 30 pessoas nos barracos, locais onde os invasores ficam instalados. É possível também ver indígenas, entre idosos e crianças, dividindo alimentação fornecida pelos invasores.
Neste sábado (4), durante a visita em Roraima, a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, disse que o governo já tomou ciência da saída dos invasores por meio dos serviços de inteligência. Para ela, é um bom indicativo de que as operações de destruição podem diminuir.
“Se eles saem sem precisar dessa força de segurança, dessa força policial, então melhor para todo mundo', avaliou.
Durante a coletiva, ela destacou que o garimpo ilegal é a "raiz do problema", e anunciou medidas para conter a crise de saúde e humanitária enfrentada pelos Yanomami. O foco principal do governo, segundo ela, é a retirada total dos garimpeiros.
Em outro vídeo, um grupo de mulheres pede ajuda para sair do território, pois também estão sem mantimentos. Ao pedir ajuda do "recursos humanos", uma delas diz que a caminhada para sair da Terra Yanomami é de 30 dias e que os helicópteros cobram R$ 15 mil por voo.
"A gente está vindo aqui para pedir para vocês compartilharem esse vídeo no Facebook para pedir que acionem os recursos humanos [direitos humanos]. Não estão resgatando ninguém, a gente está preso aqui e a gente não vai ter mais alimentação. Os indígenas vão começar a ficar estressados, porque a gente que dá comida para eles".
Em um grupo chamado de "Amigos do Rio Uraricoera" – em referência à principal via fluvial usada pelos garimpeiros para chegar aos acampamentos dentro da Terra Indígena Yanomami –, uma pessoa diz que tem ao menos 5 mil garimpeiros em busca de sair do local, mas não há voos.
Foi em um grupo também chamado de "Amigos do Rio Uraricoera" que fotos mostraram a venda de remédios do SUS por garimpeiros. Em maio do ano passado, uma mulher foi ofertada como prêmio principal de um bingo destinado a garimpeiros.
Com a retirada dos invasores do local, uma das preocupações apontadas por lideranças locais, segundo Lucia Alberta Andrade, assessora de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), é a ida do garimpo para outras terra indígenas como a Raposa Serra do Sol, também localizada em Roraima.
Ela destacou ainda que as ações irão evitar o que aconteceu na década de 1990, quando houve outro processo de destruição de garimpeiros. À época ocorreu o chamado massacre de Haximu, com o assassinato de 16 Yanomami.
Crise Yanomami
Em janeiro deste ano, o presidente Lula esteve em Roraima para acompanhar a crise sanitária dos Yanomami. Na ocasião, ele prometeu pôr fim ao garimpo ilegal na Terra Yanomami
A Terra Yanomami tem mais de 10 milhões de hectares distribuídos entre os estados de Amazonas e Roraima, onde fica a sua maior parte. São cerca de 30 mil mil indígenas vivendo na região, incluindo os isolados, em 371 comunidades.
A região está em emergência de saúde desde 20 de janeiro e inicialmente por 90 dias, conforme decisão do governo Lula. Órgãos federais auxiliam no atendimento aos indígenas.
As ações de desintrusão devem ser coordenadas pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, que no último dia 30 publicou a criação de um grupo de trabalho para elaborar, em 60 dias, medidas de combate ao garimpo ilegal em terras indígenas.